sexta-feira, 1 de agosto de 2014

O fim do complexo de vira-lata?

      


      O dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues certa vez destacou que o brasileiro sofria de um complexo de vira-lata. Essa expressão dada pelo escritor foi em relação ao trauma sofrido pelos brasileiros com a derrota da copa de 1950, realizada no Brasil, mas esse sentimento estava muito além do futebol. A derrota para os uruguaios não custou apenas uma taça, e sim o desejo de grandeza que o brasileiro carecia para se libertar do passado de colonizado, que diminuía sua estima. O brasileiro para Nelson Rodrigues seria um Narciso às avessas que cuspia na sua própria imagem e não acreditava na sua nação. Na abordagem do jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, esse retrospecto seria mudado no governo de Juscelino Kubichek atrelado a uma tabelinha com o futebol.
            Em um dos capítulos do livro “Feliz 1958 o ano que não devia acabar”, intitulado “A tabelinha de Pelé e JK”, o jornalista Joaquim Ferreira dos Santos apresenta como o futebol seria utilizado como carro chefe para mobilizar o povo e aumentar o carisma em cima do governante da nação Juscelino Kubichek no ano 1958.  O presidente JK iniciara esse ano ainda sofrendo pressão das correntes militares e dos oposicionistas que se utilizavam de jornais para atacá-lo. Diante dessa pressão, JK possuía um trunfo nas mangas, e esse trunfo era a construção de Brasília, uma capital moderna, e pelo o andar da construção, a nova capital federal seria entregue na data estipulada pelo presidente em 21 de abril de 1960. Todavia, um problema tinha que ser “resolvido” a autoestima do brasileiro, que tinha sido atacada com a derrota do seu excrete de futebol em 1950.
            Como uma derrota em um esporte poderia gerar um trauma em uma nação? E evidenciar problemas antigos que o brasileiro possuía em sua estima? A reposta para essas perguntas podem ser respondidas com uma passagem da obra de Joaquim Ferreira dos Santos, ao narrar que os jogadores da seleção brasileira tremeram dentro de campo. E, além disso, foram submissos admitindo que o seu adversário fosse superior. A tapa que o zagueiro Bigode levou de um uruguaio sem revide, seria a prova da aceitação daquele complexo que Nelson Rodrigues evidenciou. O brasileiro sentiu a dor da derrota, pois o futebol já era um esporte considerado pelos brasileiros nesse período uma arte já dominada com excelência por seus nativos. A construção do trauma surge daí, se não era possível ganhar no que somos bons, imagine no que não temos de bom. Nesse contexto Joaquim Ferreira nos apresenta JK e o garoto Pelé que mudariam esse paradigma no ano 1958.
            A ajuda financeira do governo a CBD (Confederação Brasileira de Desportos) seria fundamental para o propósito de alavancar a estima do brasileiro. Os jogadores da seleção brasileira foram preparados para uma “guerra”. Ao lado desses jogadores uma bateria de profissionais que dariam apoio para estes, inclusive para brigar se fosse o caso. A contratação do preparador físico Paulo Amaral, não seria apenas pelos seus dotes como profissional, e sim, segundo Joaquim Ferreira do Santos, pela sua fama de desordeiro no Rio de Janeiro, o seu porte físico ajudaria nas confusões que a seleção brasileira poderia ter na Suécia. A iniciativa do presidente JK de financiar a seleção, no intuito de conquistar a taça do mundo seria positiva. Da Suécia nossos jogadores voltariam com a taça de campeão. Todo investimento feito por JK para apagar o “trauma” de 1950 seria positivo para o seu governo. A gratidão do presidente, para com os jogadores era tanto que segundo Joaquim Ferreira dos Santos, o mesmo não se contentou em apenas em receber os jogadores no palácio do Catete, e sim premiou os familiares dos atletas com empregos públicos.
Esse gesto de JK mostra a importância do feito para nação brasileira, que comemorava ao som de uma canção que iniciava assim: “A taça do mundo é nossa com brasileiro não há que possa”. A canção já demonstra o quanto a estima do brasileiro teria aumentado com essa conquista. Até chegando ao ponto do presidente Juscelino Kubichek falar grosso com os Americanos, que estavam dificultando para emprestar dinheiro, JK precisava do dinheiro para sequenciar suas obras. Já que os americanos não queriam ajudar, ameaçar se aliar aos Soviéticos era uma boa alternativa, que com certeza mobilizou os americanos a viabilizar recursos para as obras de JK.
A Tabelinha de Pelé e JK escrita pelo jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, acaba mostrando bem, como o presidente Juscelino Kubichek se aproveitou do momento que o Brasil vivenciou em 1958. A empolgação do povo brasileiro com o título da seleção brasileira fazia com que os jornais esquecessem um pouco da dívida externa que estava alta, em decorrência dos muitos empréstimos feitos por JK para financiar a construção de Brasília, como também a inflação que chegava a altos índices. Isso não importava o brasileiro estava feliz, tinha sido campeão no estrangeiro, e descoberto um craque, o menino Pelé. Junto com ele JK tabelou, e marcou um verdadeiro gol de placa. Se o ano de 1958 foi bom para o Brasil, para o presidente Juscelino Kubichek foi maravilhoso, pois este conseguiu afastar seu principal adversário Carlos Lacerda da imprensa, e viu sua popularidade aumentar, mesmo com os muitos problemas sociais vividos no Brasil. Então se 1958 começou para JK com turbulências, findava apoteoticamente na visão de Joaquim Ferreira dos Santos.


Ronyone de Araújo Jeronimo