O dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues certa vez destacou que o brasileiro
sofria de um complexo de vira-lata. Essa expressão dada pelo escritor foi em
relação ao trauma sofrido pelos brasileiros com a derrota da copa de 1950,
realizada no Brasil, mas esse sentimento estava muito além do futebol. A
derrota para os uruguaios não custou apenas uma taça, e sim o desejo de
grandeza que o brasileiro carecia para se libertar do passado de colonizado,
que diminuía sua estima. O brasileiro para Nelson Rodrigues seria um Narciso às
avessas que cuspia na sua própria imagem e não acreditava na sua nação. Na
abordagem do jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, esse retrospecto seria
mudado no governo de Juscelino Kubichek atrelado a uma tabelinha com o futebol.
Em um dos
capítulos do livro “Feliz 1958 o ano que não devia acabar”, intitulado “A
tabelinha de Pelé e JK”, o jornalista Joaquim Ferreira dos Santos apresenta como
o futebol seria utilizado como carro chefe para mobilizar o povo e aumentar o
carisma em cima do governante da nação Juscelino Kubichek no ano 1958. O presidente JK iniciara esse ano ainda
sofrendo pressão das correntes militares e dos oposicionistas que se utilizavam
de jornais para atacá-lo. Diante dessa pressão, JK possuía um trunfo nas
mangas, e esse trunfo era a construção de Brasília, uma capital moderna, e pelo
o andar da construção, a nova capital federal seria entregue na data estipulada
pelo presidente em 21 de abril de 1960. Todavia, um problema tinha que ser “resolvido”
a autoestima do brasileiro, que tinha sido atacada com a derrota do seu excrete
de futebol em 1950.
Como uma derrota
em um esporte poderia gerar um trauma em uma nação? E evidenciar problemas
antigos que o brasileiro possuía em sua estima? A reposta para essas perguntas
podem ser respondidas com uma passagem da obra de Joaquim Ferreira dos Santos,
ao narrar que os jogadores da seleção brasileira tremeram dentro de campo. E,
além disso, foram submissos admitindo que o seu adversário fosse superior. A
tapa que o zagueiro Bigode levou de um uruguaio sem revide, seria a prova da
aceitação daquele complexo que Nelson Rodrigues evidenciou. O brasileiro sentiu
a dor da derrota, pois o futebol já era um esporte considerado pelos
brasileiros nesse período uma arte já dominada com excelência por seus nativos.
A construção do trauma surge daí, se não era possível ganhar no que somos bons,
imagine no que não temos de bom. Nesse contexto Joaquim Ferreira nos apresenta
JK e o garoto Pelé que mudariam esse paradigma no ano 1958.
A ajuda
financeira do governo a CBD (Confederação Brasileira de Desportos) seria
fundamental para o propósito de alavancar a estima do brasileiro. Os jogadores
da seleção brasileira foram preparados para uma “guerra”. Ao lado desses
jogadores uma bateria de profissionais que dariam apoio para estes, inclusive
para brigar se fosse o caso. A contratação do preparador físico Paulo Amaral,
não seria apenas pelos seus dotes como profissional, e sim, segundo Joaquim
Ferreira do Santos, pela sua fama de desordeiro no Rio de Janeiro, o seu porte
físico ajudaria nas confusões que a seleção brasileira poderia ter na Suécia. A
iniciativa do presidente JK de financiar a seleção, no intuito de conquistar a
taça do mundo seria positiva. Da Suécia nossos jogadores voltariam com a taça
de campeão. Todo investimento feito por JK para apagar o “trauma” de 1950 seria
positivo para o seu governo. A gratidão do presidente, para com os jogadores
era tanto que segundo Joaquim Ferreira dos Santos, o mesmo não se contentou em
apenas em receber os jogadores no palácio do Catete, e sim premiou os
familiares dos atletas com empregos públicos.
Esse gesto de JK mostra a importância do feito para nação
brasileira, que comemorava ao som de uma canção que iniciava assim: “A taça do
mundo é nossa com brasileiro não há que possa”. A canção já demonstra o quanto
a estima do brasileiro teria aumentado com essa conquista. Até chegando ao ponto
do presidente Juscelino Kubichek falar grosso com os Americanos, que estavam
dificultando para emprestar dinheiro, JK precisava do dinheiro para sequenciar
suas obras. Já que os americanos não queriam ajudar, ameaçar se aliar aos
Soviéticos era uma boa alternativa, que com certeza mobilizou os americanos a
viabilizar recursos para as obras de JK.
A Tabelinha de Pelé e JK escrita pelo jornalista Joaquim Ferreira
dos Santos, acaba mostrando bem, como o presidente Juscelino Kubichek se
aproveitou do momento que o Brasil vivenciou em 1958. A empolgação do povo
brasileiro com o título da seleção brasileira fazia com que os jornais esquecessem
um pouco da dívida externa que estava alta, em decorrência dos muitos
empréstimos feitos por JK para financiar a construção de Brasília, como também
a inflação que chegava a altos índices. Isso não importava o brasileiro estava
feliz, tinha sido campeão no estrangeiro, e descoberto um craque, o menino
Pelé. Junto com ele JK tabelou, e marcou um verdadeiro gol de placa. Se o ano
de 1958 foi bom para o Brasil, para o presidente Juscelino Kubichek foi
maravilhoso, pois este conseguiu afastar seu principal adversário Carlos Lacerda
da imprensa, e viu sua popularidade aumentar, mesmo com os muitos problemas
sociais vividos no Brasil. Então se 1958 começou para JK com turbulências,
findava apoteoticamente na visão de Joaquim Ferreira dos Santos.
Ronyone de Araújo Jeronimo