terça-feira, 28 de agosto de 2012

Quando a ficção se confunde com a realidade


        
          É interessante pensar que a vida em alguns momentos ganha uma aparência semelhante a um produto cinematográfico. Porém, essa semelhança pode ser justificada em razão das artes cênicas serem uma produção humana. Logo, as criações que são elaboradas para o cinema, TV e teatro tentam representar um pouco do nosso cotidiano, mesmo que em alguns momentos o que seja apresentado não reflita nossa vida em sociedade, mas algo em comum será encontrado nos diálogos em que os personagens irão introduzir na trama. Os atores e atrizes levam a sério o papel que foi concedido, e de uma forma ou de outra, tentam dar uma cara aquela construção sem rosto, mas, que ganha forma no corpo de quem está encenando.
Essa entrega dos atores cria um aspecto de realidade, no entanto, o que está sendo transmitido se trata de uma produção ficcional. Mas o que seria ficção e realidade?  Se avaliarmos rapidamente chegaríamos logo a uma resposta, dizendo que a ficção é algo que engloba nosso imaginário, algo impossível só visto em filmes e livros. Diferente do que fora expresso sobre a ficção, a realidade apareceria como sendo algo que está plausível, que não possui fugas, nem tão pouco finais sempre felizes. Pois a vida acaba sempre com a morte do ser. A resposta que fora construída em razão da pergunta que fora formulada, é o que vem em nossa cabeça. Porém, se pararmos mais um pouco para pensar, logo se constataria que a realidade anda de braços dados com a ficção.
O ser humano tende a interpretar um papel, ou vários ao longo de sua vida, sem ao menos prestar atenção nesse fato. Um dos primeiros estudiosos a destacar esse comportamento humano foi o cientista social canadense Erving Goffman na sua obra intitulada “A representação do eu na vida cotidiana” de 1959. Dentro dessa obra Goffman destacou que o ser humano produz eternas representações dramatúrgicas. A partir desta colocação fora possível elaborar conceitos que destacam a nossa vocação para arte cênica. Uma delas é a performance. Diante de situações improváveis ela se torna visível e isso pode ser constatado em um exemplo a qual Goffman destaca, o fato de um ser inferior financeiramente quando visitado por um superior, tende criar um espaço familiar para o superior buscando manter uma relação afetiva para adquirir favores futuros. Para isso ocorrer é necessário o inferior ter já certo conhecimento do superior para criar uma performance convincente que ludibrie a opinião que o superior tinha construído antes daquele encontro.
Goffman atenta também para a construção de fachadas, a qual muitas vezes nos escondemos e isso também se reflete a esta tendência dramatúrgica que nós possuímos. O fato de possuirmos uma personalidade e tentarmos se passar por outra, se trata de uma tentativa de esconder nosso eu, que não agrada os outros, e que ajuda a construir diferentes personagens que possa tornar agradável nossa presença. Acabamos assim, nos utilizando de máscaras que escondem nossos lados obscuros e dissimula o que realmente somos. Tendemos a atuar de variadas formas, em principio para se viver um mendigo é necessário de um figurino que seja condizente com o local a qual o mesmo vai ocupar.  O traje e o cenário são fundamentais para uma boa atuação. Imagine um pedinte com roupas de grifes em um Shopping Center, qual seria o poder de convencimento desta pessoa para angariar donativos? Acredito que nenhum.  O local e o figurino adequado é que define a boa encenação.
Hoje temos os reality shows,  programas de TV que confinam pessoas para monitorar os seus comportamentos em razão de criar para o telespectador que está assistindo aquele produto algo que é exposto como sendo a vida real. No entanto, o que se vê são pessoas, que na ganância de conquistar o prêmio que o programa dar, assumem papéis para iludir quem está ao seu lado e ao público preferencialmente. O que ocorre nesses programas, se trata em certo sentido do mesmo contexto de um local de trabalho. Por exemplo, uma firma. Um funcionário tentará passar uma imagem para o patrão que propriamente não faz parte da sua característica só para conseguir deste uma promoção ou aumento no salário, tudo pelo intuito de obter uma melhor condição financeira. A encenação se mostrou visível, e também fora convincente.
A arte de atuar, nos mostra que todos nós de vez em quando assumimos papéis, que não são propriamente quem somos. Mas, talvez esse quem somos, também não seja um papel que encenamos, e que levamos conosco até o fim da vida? É algo a se refletir.  Muitas vezes percebemos que o real e o ficcional se confundem em circunstância do comportamento humano que assume papéis diversos.

Ronyone de Araújo Jeronimo

sábado, 11 de agosto de 2012

Homicídios: vitimização das mulheres brasileiras



Ao longo dos últimos anos temos percebido que a violência urbana tem sido alvo de muitas discussões em nível nacional. Diante do debate sobre a violência no Brasil, alguns pesquisadores estão se esforçando em compreender a lógica existente em tal fenômeno. Nesse sentido, estudos feitos pelo Mapa da Violência 2012 no Brasil vem trazer à tona dados referentes à ocorrência do fenômeno em território brasileiro. Este ano tal estudo trouxe também um anexo que mostra a vitimização feminina por homicídios. De acordo com o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz (2011), informações relativas a esta questão são poucas no Brasil, e por isso este julgou oportuno tal divulgação de dados devido a sua relevância.
Waiselfisz afirma que a fonte básica para a análise sobre os homicídios no Brasil é o Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. A Lei brasileira de n° 6.216, de 31/12/1973, aponta que nenhum indivíduo pode ser sepultado sem que tenha a certidão de óbito, já que este é um instrumento que fornece dados referentes à idade, sexo, estado civil, profissão e local de moradia da vítima.
Ainda segundo este estudo, outra informação importante que a legislação brasileira exige é a causa de morte.  Dentre as causas de morte temos o homicídio. Este é caracterizado pela presença de uma agressão de caráter intencional de terceiros, de modo que estes fazem uso de qualquer meio para que sejam provocadas lesões ou danos a vitima, levando esta a óbito. Dentre os meios mais utilizados para tais fins, encontramos, por exemplo, o enforcamento, o estrangulamento, disparos de arma de fogo e etc.
Não é de hoje que temos noticiado pelos meios de comunicação à ocorrência de homicídios que vitimizam muitos de nossos brasileiros. São homens, mulheres e crianças que são alvos de seu poder destruidor e mortal. Acontece que tem sido um fato frequente a preocupação com relação à violência contra a mulher. Nesse sentido, procuraremos através deste, nos esforçar para trazer à tona alguns dos principais dados que se destacam quando tratamos sobre o fenômeno do homicídio contra as mulheres, que tem levado muitas de nossas brasileiras a óbito.
O Mapa da Violência 2012 mostra um breve histórico das mulheres que foram assassinadas entre os anos de 1980 e 2010. Segundo este documento, nesse período de 30 anos, cerca de quase 91 mil mulheres foram assassinadas. Os dados mostram que o número de mulheres vítimas de tal violência no ano de 1980 foi de 1.353, e passou para 4.297 em 2010, ou seja, o crescimento do número de mortes catalogadas foi de 217,6%, segundo Waiselfisz.
Outra informação relevante nesse estudo é no que concerne aos instrumentos utilizados para atingir a vítima. Dentre eles o mais frequente é o uso da arma de fogo (53,9%), mas encontramos também os objetos cortantes e penetrantes, e além desses, o uso da sufocação que são muito recorrentes quando tratamos da violência homicida contra a mulher. Quanto ao local que ocorrem tais incidentes, a residência ou domicílio da vítima é o mais preponderante, atingindo a marca de 40% dos casos.
Pelo que vemos os dados não se esgotam. Levando em conta os estados brasileiros (100 mil mulheres/2010), o Espírito Santo fica em 1° lugar, com taxa de 9,4 de mulheres assassinadas, enquanto que o estado do Piauí fica em 27° lugar, em último, com taxa de 2,6 brasileiras (em 100 mil). A título de exemplo, o estado da Paraíba fica em 4° lugar, com taxa de 6,0 mulheres vítimas de homicídios.
As idades das mulheres vítimas de homicídios no Brasil estão concentradas entre 15 e 29 anos, com maior ênfase no intervalo de 20 a 29 anos de idade. Nos primeiros anos de idade, por volta dos 4 anos, as meninas são vitimas de suas mães. Chegando aos 14 anos, os pais são seus principais agressores. O papel de agressor com o passar do tempo, é substituído pelo cônjuge, namorado ou os ex, de modo que estes agridem mulheres por volta dos seus 20 a 59 anos de idade. A partir dos 60 anos, as mulheres são vitimas de seus filhos.
Pelo que vemos através do estudo do Mapa da Violência 2012, os homicídios contra as mulheres são alarmantes e merecem nossa atenção. Expusemos apenas alguns dados, mas estes se revelam preocupantes. Percebe-se através desse estudo que os níveis de vitimização das mulheres são acompanhados de elevados graus de tolerância da violência contra a mulher. Mesmo que as mulheres tenham uma lei a seu favor, A Lei Maria da Penha, promulgada em 2006 que neste ano comemoramos 6 anos de sua existência, e mesmo que esta tenha possibilitado uma considerável queda nos casos de homicídios contra a mulher no ano de sua implantação, em 2008 as taxas aumentaram se analisarmos com cuidado os dados do Mapa da Violência. É perceptível que ainda carecemos de políticas públicas suficientes para que se possa reverter tal situação. Nesse sentido, não resta dúvida de que se faz necessário medidas cabíveis que sejam capazes de prevenir e consequentemente diminuir o fenômeno da violência contra a mulher. E que possamos ser capazes de usar as ferramentas necessárias para extinguir ou ao menos reduzir tais taxas, denunciando às autoridades possíveis casos de violência, no caso das mulheres que se sentem ameaçadas, procurarem ajuda das entidades que lidam com tal questão. Cabe a nós como membros da sociedade brasileira nos mobilizarmos a fim de que os agressores sejam punidos de acordo com suas práticas, e mais que isso, evitar que tais mortes sejam concretizadas.

Gláucia Santos de Maria