terça-feira, 12 de julho de 2011

Zadoque* : renascendo sem trocar de roupa

"A figura tradicional do crente vestindo um terno preto, segurando uma Bíblia e seguido de sua mulher trajando um vestido comprido e cabelo longo, foi substituída pelos fiéis usando roupas descontraídas, coloridas e cabelos da moda" ( Márcia Regina da Costa).
É o que verificamos em muitas denominações protestantes que vem tomando forma e o gosto dos devotos que primam por uma maior liberdade de manter seu estilo, mas sem deixar de lado seus ideais cristãos.
Sobre uma dessas igrejas fundadas no âmbito evangélico, queria dar destaque a Zadoque, grupo estudado pela professora  de Antropologia Márcia Regina da Costa, mas analisando tão somente seus ideais e características. Tendo em vista que Costa realizou um estudo mais aprofundado quanto a questão da origem desse tipo de religião, de modo que ela argumenta sobre tribos urbanas, bem como os aspectos midiáticos que esse tipo de instituição procura potencializar a circulação dos seus preceitos através dos veículos de informação.
A Zadoque foi fundada em 1999,  na Barra Funda e surgiu devido a necessidade de evangelizar jovens do subúrbio, da periferia de São Paulo, tendo em vista que a igreja da qual vieram, a Renascer em Cristo, tinha como alvo estabelecido, os jovens da classe média e alta. E um dos membros dessa denominação sentindo-se discriminado,devido seu estilo, de acordo com Batista (pastor da Zadoque e líder de uma banda heavy metal- Anti-Demon) resolveu criar uma igreja que pudesse resgatar a juventude marginalizada que por vezes é vista como violenta, consumidora de drogas e formadora de gangues.
A fachada do templo da Zadoque é colorida com tons fortes, que mais parecem com os os cenários produzidos para espetáculos de shows de rock e rap. Seu interior é pintado de preto, com luzes especiais que iluminam o ambiente. Encontramos também, no fundo do palco a bandeira do Brasil e também dizeres que se expressam da seguinte maneira: "Minha Pátria para Cristo".
Na entrada do templo podemos encontrar diversos jovens que aguardam o início do espetáculo/culto/pregação, como bem coloca a professora. São punks, carecas (inspirados nos skinheads ingleses), rappers e outros. Muitos destes não fazem parte da igreja, mas frequentam principalmente os shows (gratuitos) que são transmitidos pelas bandas, e durante estes são recolhidos alimentos não-perecíveis para serem doados. A única exigência dos membros da Zadoque é que as normas de convivência entre os grupos sejam respeitadas.
A iniciativa dos membros da Zadoque é interessante, pois consegue unir de maneira pacífica grupos de jovens, ou tribos diferentes, que por vezes quando se cruzam nos subúrbios, são personagens que encenam ações violentas entre si. E nesse espaço, esses diversos grupos conseguem viver sem conflitos. Por isso que o lema da Zadoque é que todos podem curtir seu estilo, desde que tenham Jesus no coração. Batista, pastor da igreja, por exemplo, em seus shows e pregações, veste-se de preto, usa botas longas e caracterizado com cabelos compridos, já que pertence a uma banda heavy metal.
As músicas que são tocadas, misturam o som de rap, rock e heavy metal com letras que exaltam Cristo. Durante os shows, dá-se início as pregações, os testemunhos. De forma que se percebe que são contrários ao mal, a corrupção do país; enfatizam a família, a moral e defendem a Pátria, o Brasil. Muitos jovens usam piercings, cabelos de vários estilos, tatuagens, pois nada disso impede de pertencer a uma igreja evangélica.
A Zadoque se expandiu no interior de São Paulo, segundo Márcia Regina, na época de sua pesquisa, e encontrou muitos adeptos em outras cidades e capitais do Brasil. No ano de 2002 foi fundada a Zadoque no México. Tentaram da mesma maneira em Portugal, mas não obtiveram êxito.
É interessante notar, como a professora aborda um tema tão importante, que é tão pouco divulgado. Segundo ela, esses jovens têm a possibilidade de serem aceitos e reconhecidos pela sociedade, de maneira que não seja construída uma imagem tão negativa, principalmente os que possuem o estilo do tipo dos carecas, muito discriminados socialmente. Esses jovens têm a oportunidade de continuarem utilizando o que "curtem" sem seguirem uma "padronização" estabelecida, e mais que isso: pregam seus preceitos sem trocar de roupa!
O papel do pesquisador nesse aspecto é de dar voz a grupos que carecem de visibilidade social, construindo a partir de seus estudos, imagens significativas que são omitidas pelo preconceito de quem de fato não conhece a fundo determinados grupos sociais. Através da pesquisa de Costa, é possível conhecer e até nos identificarmos com as "tribos", a partir do papel que esses grupos desempenham na sociedade. Inseridos nesse espaço, os jovens membros da Zadoque procuram se destacar, cada um com seu estilo e ao mesmo tempo expressando seus ideais.
* Origem Hebraica: justo, reto; retidão.
**  Márcia Regina da Costa é professora do Departamento de Antropologia da PUC-SP e pesquisadora do Projeto de Cooperação Internacional Capes/ Grices Tribus Urbanas: Produções Artísticas e Identidades.
Gláucia Santos de Maria

4 comentários:

  1. Albert Einstein dizia que por trás de toda a grandeza do universo e tudo o que nele existe sempre tem uma Força Maior capaz de mandar em tudo aquilo.
    Ainda não conhecia esse projeto da Zadoque. Achei uma ideia fantástica evangelizar esses jovens que devido às dificuldades e a violência muitas vezes tornam-se descrentes e sem Fé.
    Nunca fui de acordo com algumas "regras" impostas por algumas igrejas e é bastante significativo essas pessoas poderem ser livres em suas doutrinas.
    Em minha opinião ainda é difícil pra sociedade aceitar uma pessoa careca com alargadores e tatuagens da cabeça aos pés, mesmo que ela acredite fielmente em Deus. Ainda vejo o padrão social muito restrito quanto a isso. Essa pessoa sofre preconceitos, não consegue um bom trabalho e será, ainda por algum tempo, vista com maus olhos, mas isso deve mudar à medida que as novas gerações vão surgindo.
    Porém, infelizmente ainda é assim, e por melhor que essa pessoa seja, sempre terá alguém igual a ela (careca, tatuado com alargadores)e que terá uma vasta ficha criminal. O mesmo acontece com alguém que usa terno e gravata, a diferença dos tatuados (malvados) pros engravatados (malvados) é que os engravatados conseguem se disfarçar melhor perante a sociedade. Acredito que entre os bons e os maus, os bons sempre têm fé e quem tem fé, vai aonde quer!

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  2. Bem interessante a atitude desse pessoal da Zadoque. Acho muito válido também, pois na maioria das outras igrejas há preconceito, o que é uma tremenda contradição. Jamais aceitariam ou olhariam com bons olhos algum careca tatuado entrando num culto ou missa do domingo.
    Creio que a intenção seja a de que o mundo vai aceitando mais aos poucos os grupos que antes era rejeitados: os skatistas, os grafiteiros, os rappers, os rockeiros...

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  3. Ótimo texto e ótimo tema.

    Essa política que está se dispersando de aceitar tudo tem bons aspectos também.

    Hoje em dia tudo pode, inclusive os religiosos usarem piercing.

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  4. Obrigado pelos comentários, assim como fiquei impressionada com a proposta da Zadoque, vocês (Narallynne, Aleciano e Felipe) também ficaram.
    Só queria fazer algumas observações:
    1. De acordo com a autora, a Zadoque foi fundada em 1999, mas de acordo com Batista (líder da banda Anti-Demon), esta foi fundada em 1998, de acordo com esse link: http://noticias.gospelmais.com.br/motivos-pelo-qual-a-comunidade-zadoque-chegou-ao-fim-em-2006.html
    2. Batista, em 2002 rompeu com a rede da comunidade Zadoque. E pode ser vista as declarações deste no mesmo link anteriormente citado.
    3. Batista fundou uma nova igreja: a "CRASH CHURCH", que vocês podem conferir no seguinte link:http://www.crashchurch.com/. Ela também tem uma proposta super interessante

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